Nos últimos quatro anos, várias pessoas têm subido à Pedra da Viúva na Sexta-Feira Santa, de modo que está se criando uma tradição. Na última, como morador de Cotaxé, decidi subir também. O primeiro grupo, do qual fiz parte, saiu por volta das 4h20, da praça do distrito.
Por pouco não desisti, por duas vezes, de participar. A primeira ainda em casa, sozinho, pensando com meus botões, quando tive de arrancar alguma motivação de não sei onde, para me conduzir até o local de saída combinado, ainda de madrugada.
A segunda foi logo depois de darmos a largada, no início da subida à pedra, com pessoas que vieram de Santa Luzia do Norte e Imburana, mas a maior parte, era de Cotaxé mesmo. A grande maioria acabou saindo um pouco depois e contou também com integrantes de Ecoporanga (que estava com uma comitiva bastante expressiva vinda de ônibus) e Ponto Belo.
Mas enfim, quando comecei a subir a dificuldade principal veio de imediato, a pedra molhada, em função da chuva que havia caído naquela noite, e que fazia o meu tênis, que não era o calçado mais apropriado para aquele tipo de atividade escorregar o tempo todo, me colocando em risco de queda.
Enquanto isso, fui vendo a maioria formada pelo “pelotão de elite” se distanciar de mim montanha acima, enquanto uma moça, que estava acompanhada de seu namorado, resolveu voltar na companhia dele, ao se deparar com as mesmas dificuldades que eu. Ele acabou subindo depois.
Só não fiquei sozinho, porque dois jovens moradores de Cotaxé, o Brayan e o Cleiton, me alcançaram logo em seguida. Parece que a disposição deles acabou me arrastando junto com eles, que estavam com sandálias de dedo e que num determinado momento foi parar em suas mãos.
Como ainda estava escuro, nos valíamos das lâmpadas de nossos celulares, que pouco ajudavam encontrar os locais mais apropriados para passarmos, aqueles que não estavam tão molhados e com formação de limos. Em situações de pouca luminosidade enxergamos a superfície da rocha escura sem muita distinção, independentemente de estar molhada, ou não.
Quando víamos que não era possível transpor alguns trechos passando por sobre a rocha, ainda que com medo de algum animal peçonhento, entrávamos no meio das moitas fechadas de gravatás, que despejavam a água armazenada em suas folhas em nós e fez com que o meu tênis ficasse totalmente encharcado.
Assim que alcançamos a matinha as coisas ficaram bem melhores, o chão de terra misturado com folhas, não permitiam mais escorregarmos e numa passagem de maior dificuldade, nos valemos de uma corda amarrada por algum dos organizadores na raiz de um arbusto, para atravessarmos.
Depois deste ponto andamos um trecho bem curto e chegamos no cume de nossa Pedra da Viúva, onde tivemos o prazer de assistir o dia amanhecer por completo; ver uma cadeia de montanhas da Serra dos Aimorés, da qual pertencemos, numa espécie de meio círculo no horizonte; fragmentos de matas, em meio as pastagens, que predominam em nossa região; contemplar o nosso pequeno Cotaxé logo abaixo, ainda iluminado pelas lâmpadas dos postes e o serpenteio de um minúsculo trecho do braço norte do Rio Cricaré, que valoriza significativamente o nosso distrito.
A maioria dos participantes era formado de um público mais jovem, como aqueles que me impulsionaram a fazer a subida, mas tivemos também um veterano de 82 anos, que mesmo com problema em seu joelho direito não mediu esforços e era um dos mais animados. Aqui falo do Josué Brochini, ou “Amor do Cotaxé”, que não deixa de ser uma inspiração a mais, para aqueles que não subiram ainda, mas que pretendem um dia subir.
Depois de tantas prosas; registros fotográficos e audiovisuais; águas e lanches compartilhados, principalmente de frutas; resolvemos descer por volta das 9h, quando a pedra estava bem menos molhada e a visibilidade era bem outra, o que nos facilitou bastante.
Às 10h, quando todos e todas já haviam descido e feito o trajeto programado, foi servido um café na praça, patrocinado pela SSnet Telecom, que tem apoiado esta iniciativa em todas as suas edições.
Não deixa de chamar atenção destas subidas acontecerem justamente às Sextas-Feiras Santas, e nesta em particular – pois não vou falar das outras, porque não participei – ganhou um certo caráter de penitência, muito em função das condições climáticas. Mas independente da situação o que sobressai é o clima festivo, confraternizador e que celebra um símbolo importante de nossa cultura e também de beleza natural.
Esta foi a segunda vez que subi, a primeira aconteceu a uns 15 anos atrás, dentro de um outro contexto, quando comecei a frequentar Cotaxé e estavam presentes um pequeno grupo de amigos de fora e alguns moradores locais.
Depois das dificuldades enfrentadas por mim e outros mais, fiquei imaginando a possibilidade de corrimãos de cordas e barras de aço instaladas na rocha, pelo menos nos locais mais inclinados. Isso facilitaria o acesso, daria maior segurança, afastando os riscos de algum acidente mais grave, porque afinal, todas e todos querem checar inteiros lá no topo, para curtir legal e retornar plenos, tendo as melhores recordações e histórias bacanas para contarem, independente da subida ser à Sexta-Feira Santa, ou num outro dia qualquer, que nunca vai ser comum.
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